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A zona de conforto não tem nada de confortável. Por que, então, não saímos dela?


“Zona de conforto” é um termo bem inapropriado. Na prática, não se refere a situações onde nos sentimos confortáveis. A zona de conforto tem relação, na verdade, com aquilo que nos é familiar. É o conhecido, é aquilo com o que sentimos que sabemos lidar, ainda que se refira a situações de extremo desconforto e, muitas vezes, até mesmo de extremo sofrimento.

Por que, então, nos mantemos nela? Ou seja: por que nos mantemos em situações que nos causam sofrimento?

Como disse acima, isso tem a ver com aquilo que nos é familiar. A mente humana tem a tendência de procurar repetir situações familiares. Se determinada situação que lhe causa determinado sofrimento é bem conhecida para você, inconscientemente você irá buscar estar em situações que geram esse mesmo sofrimento. Parece ilógico, mas o inconsciente tem uma lógica muito própria e peculiar.

É muito importante entender como isso influencia nossas escolhas. O inconsciente capta os sinais de que determinada pessoa ou situação irá “me frustrar de uma maneira que é familiar para mim”. Então, é exatamente por essas pessoas e situações que me sentirei irresistivelmente atraída. Muitas vezes, contribuímos ativamente para a construção do cenário que nos causa sofrimento, mas não conseguimos nos dar conta disso. E de repente, nos vemos em determinada situação, sem saber como fomos parar ali e muito menos como sair. É preciso investigar a fundo o que você está querendo repetir e o que te impede de quebrar o “ciclo do familiar” (está aí uma denominação melhor para a zona de conforto).

Algumas pessoas e inclusive alguns colegas de profissão interpretam esse ciclo a que estou me referindo de uma maneira negativa, como um masoquismo. Afinal, nos colocar em situações que geram frustração parece mesmo uma forma de masoquismo, certo? Porém, eu prefiro ter um olhar mais positivo. A crença principal que orienta o meu trabalho é a de que os seres humanos querem viver uma experiência de felicidade e liberdade. Aplico isso especialmente às mulheres, pois é com elas que trabalho. Acredito que as mulheres desejam viver experiências de plenitude e liberdade e, por isso, dispenso conceitos que se refiram a masoquismo feminino ou qualquer coisa que se aproxime disso. Ainda bem que a Psicologia é uma área muito rica e o que não faltam são abordagens que servem muito bem como amparo teórico para o meu trabalho.

Estou com Carl Jung quando ele diz que o propósito do ser humano é realizar seu potencial inato. Jung acreditava que nascemos com um potencial maravilhoso, e nosso destino é realiza-lo. Porém, para que isso aconteça, enfrentamos desafios pelo caminho. Aprender a superar situações que representam grandes obstáculos é um aprendizado fundamental para a nossa plena realização. E, a cada vez em que nos vemos novamente em uma situação que nos deixa sem saber o que fazer, é uma nova oportunidade que temos de aprender a lidar com ela! Ou seja, podemos pensar que o inconsciente, na verdade, é um grande sábio: ele sabe com quais situações você ainda não aprendeu a lidar e, então, te coloca nelas novamente. E novamente. E novamente. Até que você, finalmente, aprenda a traçar caminhos diferentes e não repetitivos e, assim, supere, assimile o aprendizado necessário.

Mas isso é muito difícil! Isso significa conseguir abandonar a maneira como você sabe agir, e se dispor a aprender um novo caminho, até então desconhecido. Para as mulheres, isso significa, quase sempre, aprender a dizer não, a dar as costas, a colocar limites à própria compaixão. Joseph Campbell desvendou o mito do herói, revelando como esse mito se relaciona à jornada da vida humana, dos desafios que enfrentamos rumo à realização da nossa plenitude. Mas Maureen Murdock, de maneira muito perspicaz, chama atenção para a diferença da jornada do herói e da heroína, e destaca como as dificuldades que as mulheres enfrentam em sua jornada é diferente dos obstáculos enfrentados pelos homens. Para a mulher, aprender a não ser dominada pela compaixão pelos outros, entender seus limites e saber coloca-los e aprender a priorizar a si mesma é um dos maiores desafios. Isso é ilustrado no mito de Eros e Psiqué, em que o último dos quatro desafios colocados a Psiqué envolve conseguir dizer não a um homem coxo que lhe pede ajuda para apanhar lenha no chão, e a um outro que está se afogando. Ou seja, Psiqué precisa aprender a não dar ouvidos à piedade para conseguir cumprir sua tarefa. É essa a maior dificuldade das mulheres! O desafio que nos é colocado o tempo todo e que, mais cedo ou mais tarde, precisaremos vencer. Ou seguiremos uma vida de doação aos outros, sem conseguirmos cumprir a tarefa de realizar nosso propósito individual.

Sair da zona de conforto significa conseguir quebrar o ciclo de repetição do que é familiar. Significa conseguir romper com maneiras habituais de agir, descobrir novos caminhos. Não é fácil. Não é pra ser fácil. A recompensa é muito grande pra ser conseguida de maneira fácil. Ser fiel a si, às suas verdades, é o caminho para uma vida psíquica plena. Não é algo para ser alcançado com facilidade mesmo. Demanda coragem, muita coragem. Acima de tudo, coragem para descobrir o tamanho da sua força.

E ao descobrir o tamanho da sua força, tome cuidado! Você pode acabar se assustando com ela.

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